quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Crônica




Ser Mulher*



Suzete Carvalho**



“Ninguém nasce mulher; torna-se mulher” dizia a escritora Simone Du Beauvoir há mais de seis décadas, indicando dessa forma que a condição feminina é resultado de um sistemático condicionamento histórico-cultural, fundado num jeito patriarcal de ser e estar no mundo. Autora do Livro “O Segundo Sexo”, Simone inspirou as novas gerações a repensar as questões de gênero, sendo uma das principais responsáveis pela relativa evolução da mulher no espaço público, há milênios sob o domínio exclusivo dos homens.

Assim, por exemplo, a inserção da mulher no mercado de trabalho em igualdade de condições com o homem tem sido um processo muito difícil em virtude dessa tradição androcêntrica (ou, se preferirem, machista) que ainda marca nossa sociedade, privilegiando a presença masculina na maioria dos postos de comando e atribuindo aos homens os melhores salários, enquanto reluta em admitir que “a rainha do lar” é uma expressão forjada para mantê-la confinada ao espaço privado.

E por falar em espaço público e privado, uma das questões que releva considerar neste espaço, já que este é um Jornal dedicado à Mulher, é que somos, no mínimo, a metade da população e, também, que nos foi atribuído, desde sempre, o papel de “cuidadoras” por excelência. Por esse motivo, somos ainda, majoritariamente, professoras, secretárias, enfermeiras, telefonistas, empregadas domésticas e, claro, donas-de-casa, sendo que os demais espaços de realização profissional estão sendo conquistados árdua e paulatinamente.

Assim é que nos é conferida grande parte da responsabilidade para com a educação de “nossas” crianças e o cuidado com os familiares idosos. Por outro lado, cobram-nos uma beleza física e moral que, digamos a bem da verdade, não é (tão) exigida de nossos companheiros, o que faz com que dediquemos boa parte de nosso tempo com compromissos e preocupações que, muitas vezes, acabam por nos afastar da verdadeira realização, seres humanos integrais que somos.

Realização à qual, justiça seja feita, a legislação brasileira nos tem aberto as portas, já que, a Constituição garante a igualdade de homens e mulheres, sem distinções de qualquer espécie. O que nos amarra, ainda, à condição de “segundo sexo”, para usar a expressão de Simone de Beauvoir, é esse legado cultural patriarcal, arraigado socialmente, que nos tem condicionado a ser meras coadjuvantes – haja vista, entre outras situações, a ainda ínfima participação das mulheres nas eleições - num mundo tão rico em oportunidades.

Cabe também à mídia abrir portas a um tempo mais igualitário e, nesse contexto, este Jornal tem dado sua contribuição ao apresentar mulheres de sucesso nas mais diversas várias áreas, numa demonstração de que não nos faltam coragem e competência para, ombro a ombro com os homens – ou, se preferirem, ao lado de nossos companheiros - transformar a realidade, qualificando a convivência entre todos com vistas a um futuro mais digno e mais feliz.



*Publ. in Jornal Mulher, Nov/2012, pág.02.

**A autora escreve sobre temas abrangentes da experiência humana. Alguns de seus escritos podem ser acessados no blog www.novaeleusis.blogspot.com



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