segunda-feira, 9 de novembro de 2009

O Poder da mini-saia

Quando eu cursava a Faculdade, as mulheres eram proibidas de adentrar o “sagrado recinto” do Fórum trajando calças compridas, consideradas inapropriadas e incompatíveis com a “posição da mulher”, vale dizer, valia o ditado “Cada macaco no seu galho”, ou seja, calças eram vistas como coisa de “homem”. Aliás, nas camadas menos cultas da sociedade, era comum ver os homens se vangloriarem: “Lá em casa, quem usa calças sou EU”.
Na moda, imperavam Mary Quant (inventora da mini-saia) e as revolucionárias hippies, com suas magníficas batas coloridas cujo comprimento equivaleria hoje a um mini-vestido e que eram usadas sobre imensas saias indianas (um tanto deselegantes para as doutoras) ou sobre calças compridas, mais práticas, porque não lhes tolhia a liberdade de movimentos.
Nossas maravilhosas mulheres advogadas, com o inefável “jogo de cintura” que Deus lhes deu como mecanismo de defesa às violências do patriarcado, usando de inteligência e savoir-faire, não tiveram dúvidas: passaram a dirigir-se ao Fórum de batas e calças compridas. Em lá chegando, retiravam as calças e entravam tranquilamente com seus micro-vestidos para as audiências.
Rapidamente suas excelências revogaram a proibição do uso de calças para as mulheres, em nome da “moral”. O fato é que, acostumados à excessiva formalidade e pompa que valorizavam a função jurisdicional, “balançaram” diante da circunstância de as mulheres (com ou sem calças compridas) se terem “alçado” a uma posição de “igualdade” num espaço até então total e absolutamente sob o domínio masculino.
Claro que não me refiro à posição na Magistratura, àquela altura ainda inimaginável para a “condição feminina”, cujos hormônios tornavam-na “incapaz de um julgamento justo e equilibrado”, como ouvi de um desembargador (mui) amigo. Com garra, perseverança, dedicação profunda ao estudo e a paciência de quem sabe que o dia da colheita sempre chega, as mulheres foram se achegando e abrindo seu próprio espaço num campo minado, pronto a implodí-las a qualquer deslize. Hoje, embora ainda sejamos poucas representantes na maioria dos Tribunais, chegamos ao Supremo Tribunal Federal.
De alguma forma, embora jamais tenha exercido a advocacia, fui beneficiada com o “direito ao uso de calças compridas” sem necessidade de apelar ao mesmo estratagema, porquanto, funcionária à época de um Gabinete do Tribunal de Contas - cujo “Chefe” (que Deus o tenha) era fiel ao modelo Superior do patriarcado -, nos “privilegiou” com a mesma deferência concedida às doutoras da ativa e, assim, fui brindada com o direito de adentrar minha própria sala de trabalho usando trajes mais cômodos, antes prerrogativa exclusivamente masculina.
Hoje, passadas várias décadas, a situação se inverte e as calças compridas voltam a ser o traje mais apropriado às mulheres pela (falsa) moral, enquanto os hormônios masculinos são exacerbados em relação à decantada racionalidade dos homens. Mas a corda ainda arrebenta do lado (considerado) mais fraco.

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