terça-feira, 3 de março de 2009

Dia da Mulher


Até 1964 o Código Civil Brasileiro classificava as mulheres, os índios, os menores de até dezesseis anos e os loucos de todo gênero como semi-capazes para os atos da vida civil. Significa dizer que perante a lei tínhamos os mesmos direitos que nossos filhos, os índios e os doentes mentais.
Os índios, explicavam os entendidos, não estavam adaptados à vida em nossa sociedade; os ‘loucos’ não podiam ser levados a sério e os menores não podiam se responsabilizar por dívidas, até porque ainda não tinham juízo. As mulheres, bem, as mulheres eram “rainhas”, as rainhas do lar, não precisavam se preocupar com ‘problemas de homem’, tinham que ser protegidas (de quem ou de que, nunca entendi).
Éramos professoras, secretárias, enfermeiras e outras profissões ditas ‘femininas’, ou seja, aquelas que não eram muito bem pagas, nem conferiam qualquer espécie de poder.
Trabalhávamos, sim, e como! Mas não podíamos, diante da lei, dispor de nosso próprio dinheiro como bem nos aprouvesse, ou seja, sem o consentimento do papai ou do maridinho. Afinal, era a lei, feita pelos homens. Dura lei.
A década de 60 representou uma ‘virada’ na ordem das coisas, dentre as quais a situação civil da mulher. Mas o Brasil entrou numa era de repressão e a liberdade de todos, homens e mulheres, passou a sofrer restrições. Paradoxalmente, os cursos universitários proliferaram e enquanto a questão feminina decantava, as mulheres aproveitaram para se aperfeiçoar técnica e culturalmente para enfrentar os novos tempos.
Anos mais tarde, surgiu a ‘moda’ de se institucionalizar homenagens: Dia das Mães, dos Pais, da Criança, dos Namorados, etc. Paraíso dos consumidores. Tudo é desculpa para repararmos materialmente nossas desatenções. Um bom presente, e aplacamos nossa consciência pesada. Dia do Índio, Dia da Mulher, Dia da Consciência Negra e ... pronto, estão resolvidos os preconceitos! Dia do Bombeiro, Dia dos Professores, Dia dos Servidores Públicos e a Administração está redimida de seus baixos salários.
Quando eu estava terminando esta crônica, um amigo querido telefonou e quando lhe disse que estava escrevendo sobre o Dia da Mulher solidarizou-se com a homenagem, afirmando que as mulheres merecem todo seu respeito e “devem ser protegidas”. Bem a propósito a observação de meu genro, que tem alma feminina: “Protegidas ou controladas?”. Voltamos, pois, à estaca zero. Coincidências significativas a nos alertar que não bastam leis e homenagens (muito justas, aliás), para mudar a mentalidade patriarcal.

* Publ. in Revista do Ypiranga nº142, fev/2008, pág. 5.



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